quarta-feira, 16 de junho de 2010

BOM LUGAR DE ESTAR

Se cada um faz um pouquinho, a vida urbana fica muito mais agradável. Conheça exemplos de atitudes simples que alegram as cidades e seja gentil com a sua também.
Por Priscilla Santos

O arquiteto holandês Aldo van Eyck costumava dizer que uma casa é uma cidade minúscula, e uma cidade é uma casa imensa. Pense nessa comparação no seu dia-a-dia. As semelhanças não demoram a saltar aos olhos: da mesma forma que você vai do escritório ao quintal, você deixa o trabalho e faz um passeio no parque. Outro exemplo: vai do restaurante ao cinema assim como da cozinha à sala de TV depois do almoço. Certo, tanto a casa quanto a cidade são lugares onde se vivem momentos cotidianos. Mas então por que você não cuida da cidade com o mesmo esmero com que trata a casa?

Não vale dizer que isso é responsabilidade da prefeitura. Tudo bem que pagamos impostos e elegemos a cada quatro anos representantes para defender os interesses coletivos, mas isso é suficiente apenas para a infra-estrutura: saneamento básico, eletricidade, limpeza das ruas, cabos para gás. Aposto que sua "cidade minúscula" vai muito além. As paredes não estão no reboco e o chão no cimento, estão? Provavelmente tudo está bem pintado, com quadros pendurados, tapetes, plantas, porta-retratos e mil outros detalhes que fazem de sua morada o doce lar.
Um ambiente bem cuidado faz bem ao espírito. E isso é tão evidente que dá até para adivinhar como é a parte da cidade de que você mais gosta. Quer ver? Pense no quarteirão da sua casa. Dê uma volta mental ao redor dele. Que trechos você acha mais agradáveis? De quais você não gosta? Deixa eu ver se acerto. Provavelmente os pedaços menos agradáveis têm muros altos, calçadas descuidadas, sem vida. Talvez também haja prédios que cubram seus jardins com paredes de concreto e casas com grades altas e avisos de "cuidado: cão perigoso" que, se dissessem "pessoas: queremos distância", daria no mesmo. A existência de lugares assim se deve, em grande parte, à falta de atenção das pessoas com o que vai do portão de casa para fora. Como se, do passeio em diante, o problema fosse do governo, das ONGs e do que mais puder amenizar a ausência de um cidadão que faça mais do que a lei o obriga.
Também não adianta varrer o lixo e jogá-lo debaixo do tapete só para falar que fez. Ser gentil com a cidade só resolve se a atitude for espontânea, para melhorar a vida coletiva. E, para um sujeito deixar a comodidade solitária de sua vida privada e fazer algo pelo todo, é preciso que se sinta parte dele: esta cidade é minha casa, faço parte dela e, por isso, tenho que cuidar deste espaço. Ao fazer isso, acaba chamando a atenção do outro: acorde, esse lugar é nosso, vamos melhorá-lo. Os círculos virtuosos precisam de um empurrão para entrar em movimento.
A parte boa é que muitas pessoas já despertaram para isso. Os trechos agradáveis do seu quarteirão provavelmente têm árvores que dão uma boa sombra e, de quando em quando, até frutos. Ou então as casas e os edifícios oferecem algo a quem passa, nem que seja a visão agradável de uma fachada bem pintada, um jardim à vista dos passantes ou uma marquise que abriga da chuva. As calçadas provavelmente são desimpedidas e cuidadas. Pois é, a cidade também está cheia de pequenas oferendas à espera de olhares atentos para detectá-las.

Gentileza urbana

Atitudes simples capazes de trazer mais poesia ao nosso cotidiano, essa é a idéia. Gestos que surjam inesperadamente para nos devolver o prazer de viver na metrópole, de ficar na janela a observá-la, de ouvir seu som. A sinfonia dos carros a passar, dos passarinhos nas árvores, das crianças brincando na praça, dos sinos da igreja lá longe. A alegria de andar pelas ruas e sentir o cheiro do tempo e dos frutos. De ver as cores das casas e dos jardins. Talvez fossem essas sensações que, na Grécia antiga, Aristóteles já aconselhava conservar. Pelo menos, em seu livro Ética a Nicômaco, ele ressaltou o cuidado com o corpo, com a alimentação, com o amor e, sobretudo, com a cidade. Como se essa fosse tão orgânica quanto nós, palpite que Aristóteles confirma ao dizer que o que nos une à pólis é um sentimento humano: a amizade.
E foi para celebrar essa amizade que surgiu, em Belo Horizonte, o Prêmio IAB Gentileza Urbana. No início dos anos 90, a Associação Mineira de Defesa do Ambiente fazia uma lista de entidades poluidoras da cidade, e o Instituto dos Arquitetos do Brasil de Minas Gerais (IAB-MG) quis fazer o mesmo com empresas do ramo da arquitetura e construção. Porém, o então diretor de marketing da regional, João Grillo, propôs o contrário: homenagear aqueles que faziam coisas boas pela cidade. Assim, em 1993, surgiu a premiação que, ainda hoje, ocorre ano a ano. A boa nova foi descobrir que o prêmio mineiro impulsionou a criação de eventos semelhantes no Rio de Janeiro, a partir de 2000, e em Maceió, ano passado. Todos realizados pelas respectivas regionais do IAB.

(texto extraído da revista Vida Simples - Editora Abril)

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